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Reynaldo Candia tem se interessado pelo uso da colagem como forma de criação artística. Mais especificamente, nos últimos meses desenvolveu um trabalho em que utiliza livros antigos. São livros que já estão no caminho da reciclagem como papel, e que são desviados desta trajetória para recuperá-los de outra forma. Seu procedimento consite em ir cortando a partir da capa e depois folha a folha buracos que adentram no conteúdo até que o artista encontre alguma coisa que o detenha: um pedaço de texto, uma foto ou uma surpresa qualquer. Ele pode então marcar esta passagem inserindo um outro papel, foto ou objeto. Em seguida lacra o livro assim transformado dentro de uma caixa de acrílico. Este procedimento tem uma simbologia muito rica que se manifesta em vários de seus aspectos. Para começar na idéia de se fazer esta verdadeira escavação. Ela remete diretamente ao ato de procurar algo valioso, que encontra-se enterrado, como o ouro ou então as pedras preciosas. O esforço empreendido se justifica pela promessa de ganhos fabulosos. O livro é sem dúvida o repositório emblemático da riqueza mais cara à espécie humana: o conhecimento. Mas quando o ato se aplica ao objeto, a inadequação do método é gritante e remete a uma perda de noção e de referência. Por fim, vem a sua tranformação em relíquia, ao encerrá-lo em uma caixa de acrílico, evidenciando que a grande revelação foi enfim consumada. Estes pequenos objetos podem ser vistos como alegorias de uma cultura que perdeu o jeito para se relacionar com as suas conquistas, que não confia mais nos seus métodos e que tenta meio ao acaso descobrir algum novo sentido para as coisas. Quando nos pegamos lendo nas janelas apertadas que Reynaldo Candia deixou através das capas, tentando relacionar as palavras, as imagens os conteúdos, traímos a relevância da alegoria e o nosso próprio desejo de encontrar algum sentido cavocando livros.

Incisões concêntricas, precisões e simetrias; fragmentos de palavras e imagens, por vezes parcialmente encobertos por outras narrativas; volumes justapostos a compor estruturas improváveis; memórias guardadas em herméticas caixas acrílicas. São livros talhados para cumprir papeis diversos daqueles que, a princípio, lhes foram atribuídos, porém, nem por isso deixam de estabelecer diálogos com seus iguais, habitualmente perfilados em prateleiras, a repousar sobre mesas ou abertos em nossas mãos.

É da mestiçagem e do encontro de substâncias heteróclitas que o trabalho de Reynaldo Candia vai se costurando: pintura, desenho, bordados, postais antigos, embalagens, cadernos de viagens, tecidos, o couro, a taipa, a linguagem do cangaço – todo um campo afetivo e simbólico recolhido em viagens ao nordeste brasileiro, numa espécie de saga pessoal mitológica e política que remonta às origens de uma ideia de identidade nacional. Entretanto, a dimensão política que se estabelece nessa empreitada nada tem de panfletária, mas resgata o sentido político do lugar onde esse percurso d

Desde o período colonial, o Planalto Central integra o imaginário geográfico brasileiro como um ponto estratégico potencialmente capaz de promover a unificação do enorme território nacional. A primeira proposta de construção da nova capital no centro da nação foi feita em 1822, logo após a Proclamação da Independência, por José Bonifácio, que, também, criou o nome Brasília para batizar a cidade imaginada. Já nos primeiros a

Vai, me conta de novo aquela visita à biblioteca abandonada. E como um professor paciente atendendo ao pedido de um aluno vidrado numa história, Reynaldo Candia me contou pela terceira vez sua ida a uma escola cuja biblioteca repleta de livros se encontravaabandonada. A visita se deu durante o movimento de Ocupação das escolas públicas de São Paulo – “Não fechem a minha escola”. Movido por sua curiosidade de artista, Candia resolveu entrar numa escola ocupada para conhecer de perto o assunto. Ciceroneado por alguns alunos, percorreu a escola até passar pela biblioteca e percebeu que aquele local que outrora tinha sido um dos corações daquela instituição, hoje se encontravaduplamente abandonado: pelos alunos que seduzidos pelo universo digital já não tinham interesse em devorar seus livros e pelos funcio

Se os livros guardam palavras e imagens impressas, abri-los, significa desvendar em suas múltiplas camadas, seus muitos saberes. Significa ainda, sentir gramaturas, sons, texturas e aromas. Livro é objeto silencioso queencobre vozes. Fechado, não se lê. Aberto, se descobre. Fechado, oculta.Aberto, revela. São condições opostas em pacífica convivência num único objeto

Uma antiga lembrança permeia a produção de Reynaldo Candia. Ainda pequeno, o artista nutria estranha fixação por um baú cheio de fotografias de família. Deste baú, ainda na infância, saíram os primeiros recortes e reconfigurações de imagens, hoje uma constante em seu trabalho. Não que esse fato defina ou norteie a obra do artista, os recortes foram feitos sem intencionalidade ou consciência, e ele mesmo não lembrava do ocorrido, essa memória rela

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